Em 1818, o Governo Central concedeu a três colonos alemães sesmarias ao longo das margens do Rio Peruípe, doze léguas acima de Nova Viçosa, na comarca de Caravelas, no extremo sul da Província da Bahia. Logo em seguida, juntamente com outros colonos suíços e franceses, eles fundaram a Colônia Leopoldina, um conjunto de plantações que, utilizando o trabalho escravo, se dedicavam ao cultivo e à exportação do café. Foi um dos últimos empreendimentos agrícolas no Brasil a utilizar o trabalho escravo em larga escala; num tempo em que a instituição da escravidão sofria uma forte pressão externa. Mas a Colônia rapidamente prosperou e, no início da década de 1850, era responsável por quase 90% da produção de café da Província.
A escolha dos informantes em cada comunidade de fala foi feita de acordo com as seguintes variáveis estratificadas: sexo (masculino/feminino) e idade (faixa I: de 20 a 40 anos; Faixa II: de 40 a 60 anos; Faixa III: mais de 60 anos). Tinha-se, assim, seis células na amostra, com dois informantes em cada célula, constituindo um total de 12 informantes por comunidade assim distribuídos: duas mulheres e dois homens de 20 a 40 anos; duas mulheres e dois homens de 40 a 60 anos; duas mulheres e dois homens de mais de 60 anos; e um total de 48 entrevistas no conjunto das quatro comunidades selecionadas.
...As entrevistas das comunidades de Rio de Contas, Helvécia e Cinzento foram gravadas em meio magnético (fitas cassete) e depois digitalizadas. As entrevistas de Sapé já foram feitas diretamente em meio digital (gravadores de minidisk). Todas as entrevistas foram editadas em meio digital para melhorar a qualidade do áudio e eliminar ruídos. Depois foram transcritas ortograficamente de acordo com os critérios definidos no Projeto (cf. Chave de Transcrição). As transcrições foram revistas utilizando-se os meios informáticos de tratamento de áudio, em ambiente Windows.
Nesse conjunto de 48 entrevistas armazenadas em meio digital e suas transcrições, que constitui o Acervo de Fala Vernácula do Português Afro-Brasileiro do Estado da Bahia, foram selecionadas 24 entrevistas que passaram a constituir o Corpus Base do Português Afro-Brasileiro do Estado da Bahia. Para tanto, selecionou-se dois informantes de cada uma das três faixas etárias (sendo um de cada sexo) de cada uma das quatro comunidades integrantes do Acervo, de modo a equilibrar a diferença geracional na amostra, guardando-se um intervalo médio de aproximadamente 20 anos entre uma faixa etária e outra (cf. quadro abaixo). A esse conjunto de vinte e quatro entrevistas foram acrescentadas outras quatro, feitas com os dois informantes mais velhos de cada sexo. Essa faixa IV, constituída por falantes com mais de oitenta anos, seria focalizada com o intuito de se identificar os traços mais ligados aos efeitos do contato entre línguas que marca a origem dessas comunidades de fala.
O estabelecimento desse corpus visou por um lado a viabilizar uma base de dados mais factível para as análises linguísticas de aspectos muito recorrentes na fala. Por outro lado, buscou-se também estabelecer uma distribuição mais equilibrada dos informantes segundo as variáveis escolaridade e estada fora da comunidade. Essas duas outras variáveis sociais foram definidas nos seguintes termos. Na variável escolaridade, fez a distinção entre falantes analfabetos e semi-analfabetos, sendo esses últimos aqueles que tiveram qualquer experiência com o universo do letramento, mesmo que apenas "assinassem o nome". Já na variável estada fora da comunidade, fez-se a distinção entre os indivíduos que já tinham vivido pelo menos seis meses fora da comunidade (geralmente por motivo de trabalho), e aqueles que sempre moraram na comunidade. Entretanto, não se conseguiu uma distribuição perfeita, em que todas as células fossem preenchidas. Não se dispunha, por exemplo, de mulheres semi-alfabetizadas com mais de sessenta anos. Já entre os homens jovens, sucedeu o contrário, era difícil encontrar analfabetos completos. Entendemos que essas lacunas no Corpus nada mais são do que o reflexo do universo sócio-cultural em que foi feita a recolha.
No quadro abaixo, estão apresentadas as características do Corpus do Português Afro-Brasileiro do Estado da Bahia, juntamente com as características das amostras recolhidas nas quatro comunidades. No quadro, cada entrevista é indicada da seguinte maneira:
Comunidade: RC, Rio de Contas; HV, Helvécia; CZ, Cinzento; SP, Sapé.
Número da entrevista, em sua amostra original: RC-inq04, por exemplo.
Sexo do informante: F, feminino; M, masculino.
Idade do informante: 26a, vinte e seis anos.
Nível de escolaridade do informante: A, analfabeto; S, semi-analfabeto.
Estada fora da comunidade: E, o informante viveu pelo menos seis anos fora da comunidade; N, o informante viveu sempre na comunidade.
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III |
---|---|---|---|
1 | RC-Inq04 – F – 37a – A – E | RC-Inq13 – F – 47a – S – N | RC-Inq24 – F – 75a – A – N |
2 | HV-Inq01 – F – 29a – A – N | HV-Inq07 – F – 42a – A – E | HV-Inq13 – F – 85a – A – N |
3 | SP-Inq01 – F – 24a – S – N | SP-Inq05 – F – 53a – S – E | SP-Inq09 – F – 76a – A – E |
4 | CZ-Inq01 – F – 28a – S – E | CZ-Inq08 – F – 50a – A – N | CZ-Inq09 – F – 63a – A – N |
5 | (média: 29,5 anos) | (média: 45,5 anos) | (média: 74,75 anos) |
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III | FAIXA IV (+ de 80 anos) |
---|---|---|---|---|
1 | RC-Inq05 – M – 26a – S – E | RC-Inq08 – M – 55a – A – E | RC-Inq26 – M – 68a – S – E | HV-Inq19 – F – 103a – A – E |
2 | HV-Inq04 – M – 30a – S – N | HV-Inq12 – M – 57a – A – N | HV-Inq20 – M – 70a – A – E | HV-Inq22 – M – 80a – A – N |
3 | SP-Inq04 – M – 28a – A – N | SP-Inq06 – M – 42a – S – N | SP-Inq12 – M – 66a – A – N | CZ-Inq10 – F – 107a – A – N |
4 | CZ-Inq03 – M – 34a – S – E | CZ-Inq06 – M – 48a – S – E | CZ-Inq11 – M – 64a – S – N | CZ-Inq12 – M – 82a – A – N |
5 | (média: 29,5 anos) | (média: 50,5 anos) | (média: 67 anos) | (média: 93 anos 22,125 anos de diferença sobre a FAIXA III) |
Há três homens semi-analfabetos na faixa I;
Todas as mulheres da faixa III são analfabetas;
FAIXA I: 29,5 anos
FAIXA II: 49,25 anos (19,75 anos de diferença sobre a FAIXA I)
FAIXA III: 70,875 anos (21,625 anos de diferença sobre a FAIXA II)
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III |
---|---|---|---|
1 | RC-Inq01 – F – 26a – S – E | RC-Inq08 – M – 55a – A – E | RC-Inq20 – M – 77a – A – N |
2 | RC-Inq04 – F – 37a – A – E | RC-Inq09 – M – 43a – S – E | RC-Inq21 – F – 74a – A – N |
3 | RC-Inq05 – M – 26a – S – E | RC-Inq11 – F – 42a – S - E | RC-Inq24 – F – 75a – A – N |
4 | RC-Inq06 – M – 36a – S – E | RC-Inq13 – F – 47a – S – N | RC-Inq26 – M – 68a – S – E |
5 | RC-Inq07 – F – 26a – S – N |
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III |
---|---|---|---|
1 | HV-Inq01 – F – 29a – A – N | HV-Inq07 – F – 42a – A – E | HV-Inq13 – F – 85a – A – N |
2 | HV-Inq02 – M – 28a – S – E | HV-Inq08 – M – 44a – S – N | HV-Inq15 – F – 80a – A – N |
3 | HV-Inq03 – F – 35a – S – E | HV-Inq09 – F – 54a – A – N | HV-Inq19 – F – 103a – A – E |
4 | HV-Inq04 – M – 30a – S – N | HV-Inq10 – M – 50a – S – N | HV-Inq20 – M – 70a – A – E |
5 | HV-Inq05 – F – 38a – S – E | HV-Inq11 – F – 60a – A – N | HV-Inq22 – M – 80a – A – N |
6 | HV-Inq06 – M – 39a – S – N | HV-Inq12 – M – 57a – A – N | HV-Inq24 – M – 67a – A – N |
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III |
---|---|---|---|
1 | SP-Inq01 – F – 24a – S – N | SP-Inq05 – F – 53a – S – E | SP-Inq09 – F – 76a – A – E |
2 | SP-Inq02 – M – 27a – S – N | SP-Inq06 – M – 42a – S – N | SP-Inq10 – M – 70a – A – N |
3 | SP-Inq03 – F – 36a – A – N | SP-Inq07 – F – 55a – A – N | SP-Inq11 – F – 77a – A – N |
4 | SP-Inq04 – M – 28a – A – N | SP-Inq08 – M – 48a – S – E | SP-Inq12 – M – 66a – A – N |
# | FAIXA I | FAIXA II | FAIXA III |
---|---|---|---|
1 | CZ-Inq01 – F – 28a – S – E | CZ-Inq05 – M – 41a – S – N | CZ-Inq09 – F – 63a – A – N |
2 | CZ-Inq02 – F – 16a – S – N | CZ-Inq06 – M – 48a – S – E | CZ-Inq10 – F – 107a – A – N |
3 | CZ-Inq03 – M – 34a – S – E | CZ-Inq07 – F – 44a – S – N | CZ-Inq11 – M – 64a – S – N |
4 | CZ-Inq04 – M – 41a – S – E | CZ-Inq08 – F – 50a – A – N | CZ-Inq12 – M – 82a – A – N |
Observação: Como se pode observar, as amostras de Helvécia e Rio de Contas contam com mais de doze entrevistas (treze e dezoito, respectivamente).
Veja a descrição histórica, sócio-econômica e linguística da comunidade de Helvécia...
Veja a descrição histórica, sócio-cultural da comunidade de Cinzento...
Veja a descrição sócio-histórica do Município de Rio de Contas...
Veja a descrição histórica, sócio-cultural da comunidade de Sapé...